As discussões em torno do crime impossível e do princípio da insignificância em casos de furto são recorrentes. Um exemplo é o julgamento analisado pelo desembargador Alexandre Victor de Carvalho, no Tribunal de Justiça de Minas Gerais, envolvendo uma tentativa de furto em supermercado. O caso revisitou questões cruciais sobre a possibilidade de consumação do delito sob vigilância constante e os limites para aplicação do princípio da insignificância.
Entenda aqui como esta decisão demonstra a complexidade do tema e a divergência entre os magistrados, revelando diferentes interpretações sobre a tipicidade e a punibilidade da conduta.
A configuração do crime impossível
No julgamento relatado por Alexandre Victor de Carvalho, a questão central foi a possibilidade de se caracterizar o crime impossível. Segundo o desembargador, o fato de a acusada estar sob vigilância constante do supermercado configurava uma situação de ineficácia absoluta do meio para consumar o furto. Para ele, não havia risco real ao patrimônio da vítima, pois o bem jurídico estava protegido, o que impossibilitava o crime, conforme o artigo 17 do Código Penal.

O entendimento do desembargador se baseou em precedentes e doutrina que reforçam que, para existir crime impossível, é necessário que o meio utilizado seja absolutamente ineficaz ou que o objeto do crime, seja absolutamente impróprio. No caso em questão, a vigilância constante do estabelecimento, com câmeras e seguranças, foi considerada uma proteção absoluta, o que afastava a possibilidade de a acusada concluir o delito. Para o desembargador, a tentativa de furto não poderia ser punida.
Divergência entre os magistrados
A decisão de Alexandre Victor de Carvalho não foi unânime. A desembargadora, revisora do acórdão, adotou uma posição oposta. Ela argumentou que o fato de a acusada estar sendo vigiada não tornava o crime impossível, pois ainda existia a possibilidade, mesmo que mínima, de sucesso na empreitada criminosa. Para ela, a proteção por câmeras e seguranças não eliminava o risco de prejuízo ao patrimônio.
A divergência entre os desembargadores reflete uma divisão comum na jurisprudência brasileira. Enquanto alguns magistrados entendem que a vigilância contínua impede a consumação do crime e, portanto, caracteriza o crime impossível, outros sustentam que a mera vigilância não impede a prática do delito, sendo apenas uma dificuldade adicional para o agente. No caso analisado, o voto médio da desembargadora revisora prevaleceu, resultando na condenação da acusada.
O princípio da insignificância e o furto qualificado
Outro ponto relevante na decisão foi a discussão sobre o princípio da insignificância. Alexandre Victor de Carvalho reforçou que o ordenamento jurídico brasileiro não reconhece o princípio da insignificância para crimes de furto qualificado. Para o desembargador, o valor dos bens furtados, mesmo que baixo, não era suficiente para descaracterizar a tipicidade penal. Ele ressaltou que a política criminal brasileira não admite a aplicação desse princípio em casos que envolvam reiteração de pequenos delitos.
Por outro lado, a revisão do acórdão também abordou o tema do furto privilegiado, que se aplica aos casos em que o agente é primário e o valor da res furtiva é considerado pequeno. No entanto, para o desembargador, a presença de qualificadoras no crime de furto afasta a possibilidade de aplicação do privilégio. Em sua visão, a combinação de furto qualificado com o privilégio seria uma contradição, o que reforça sua posição de que a tipicidade formal deve ser respeitada.
Em conclusão, o julgamento analisado pelo desembargador Alexandre Victor de Carvalho trouxe reflexões importantes sobre o conceito de crime impossível e os limites do princípio da insignificância em casos de furto. Sua interpretação, focada na proteção do bem jurídico e na ineficácia absoluta dos meios utilizados pela acusada, foi decisiva para o entendimento da questão. No entanto, a divergência com a desembargadora demonstrou que a matéria permanece em aberto, refletindo a complexidade do direito penal brasileiro.
Autor: Jonh Tithor